Thomas Haferlach: “A Rua Augusta vai acabar virando a Vila Olímpia”

THOMAS HAFERLACH, produtor cultural e idealizador da festa Voodoohop

Como era a noite em São Paulo quando você começou a morar aqui?

Thomas Haferlach: Quando cheguei era bem burocrático, careta mesmo. Porque eu ainda não estava aqui, mas fiquei sabendo que São Paulo teve uma época bem louca nos anos 80 e 90. Mas em 2006, quando mudei pra cá, tudo era muito segmentado, nada se misturava. Tinha a galera do rock, a galera do samba, do hip-hop. Você ficava preso em uma tribo e não podia ir para a outra. Já eu sou mais eclético, gosto de várias músicas, gosto da pista, gosto também de beber no bar. GOSTO DA LIBERDADE DE PODER ESCOLHER. Mas antes era um ou outro. Cidades como Berlim e Londres sempre foram mais criativas no sentido de brincar com o espaço que têm. Aqui era tudo focado no DJ e seguia uma certa fórmula, sem lugares mais inusitados.

E quando você teve a ideia de fazer uma festa sua?

TH: Eu discotecava no Bar do Netão, na Augusta.  Não ganhava nada tocando lá e por algum tempo foi assim. A intenção não era criar uma festa, eu tinha a intenção de me divertir, de tocar as músicas que eu gostava e não escutava nas festas que já tinha ido. Só que tomou uma força maior, muita gente gostou, ficou cheio a ponto de ter gente na calçada.  Foi assim que surgiu a Voodoohop. SURGIU PORQUE A CIDADE PEDIA DIVERSÃO, não foi nada planejado.

Você gosta de pensar que mudou a cara da balada paulistana?

TH: Com certeza fizemos parte dessa mudança. Queria uma balada que não mexesse só com os ouvidos, mas que despertasse outros sentidos, com instalações, vídeos, performances. Arte dentro de uma experiência, sabe? E nós começamos a fornecer isso. Passamos também a ocupar mais o centro velho da cidade. Eu gosto desse lance de decadência do centro, porque sou da Europa, né? Então gosto de coisas velhas. Todo mundo tinha medo de andar por lá e agora está mais frequentado, a cara dessa parte da cidade à noite é outra. MUDAMOS TAMBÉM O COMPORTAMENTO DAS PESSOAS.

Muitas programações da Voodoohop ainda são grátis. Dá pra ganhar dinheiro desse jeito?

TH: É, de 50 a 80% da nossa programação ainda são grátis, na rua, e outras são baladas pagas em lugares fechados. É um bom balanço. Às vezes trazemos alguns artistas de fora e isso custa grana. As baladas pagas viabilizam as festas na rua. Mas temos feito menos e menos baladas. HOJE JÁ CONSIGO VIVER DA VOODOOHOP, mas estou com outro foco agora. Vou participar da Virada Cultural e eu estou inscrevendo novos projetos para lei de incentivo.

E rola algum arrependimento?

TH: Acho que meu único arrependimento é de ter ficado tantas vezes acordado por 24 horas. Mas, falando sério, acho que corri vários riscos. Já fiz festas sem permissão, uma vez em um lugar sem alvará, mas eu não sabia. Começou um boato de que era uma festa “clandestina, proibida”, mas não era nada disso. Nesse ramo, tem sempre o risco de ficar sem a grana investida. É MAIS FÁCIL PERDER DINHEIRO QUE FICAR RICO. Mas são esses riscos também que me impulsionam, porque hoje vejo que construímos algo legal, que agrega vários tipos de pessoas.

Você começou na Rua Augusta. O que pensa sobre ela hoje?

TH: A Augusta ainda é interessante. Ainda tem aquela mistura, de tudo quanto é tipo de gente, mas o momento legal já passou. Os prédios caros, edifícios comerciais de milhões de reais estão se instalando por ali. A AUGUSTA VAI ACABAR VIRANDO A VILA OLÍMPIA.

E qual o lugar mais legal da cidade agora?

TH: A NOVA CARA DE SÃO PAULO É O CENTRO. Não há como duvidar disso. É lá que os coletivos se reúnem, que as festas e movimentos acontecem. A cidade pulsa por lá, você percebe que ali tem gente disposta a transformar o mundo. Gosto muito de lugares como a Praça Roosevelt e também a Praça Dom José Gaspar.

 

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